Gestão é o processo de planejar, supervisionar/acompanhar e avaliar o cumprimento de metas e objetivos previamente estabelecidos, visando sempre à expansão ou à manutenção dos negócios em seu devido mercado.
O setor educacional não é exceção, especialmente o mercado de ensino de idiomas. Há, somente na Associação Brasileira de Franchising, 35 franquias especializadas na oferta desse serviço. Não se contabilizam aqui as chamadas escolas independentes, que chegam às milhares em todo território nacional.
A vantagem de uma franquia está na aquisição do know how e suporte dos departamentos comercial, financeiro, pedagógico/acadêmico e de marketing, além do branding da franquia escolhida. Porém, por mais surpreendente que pareça, há muito empirismo na gestão do processo educacional.
Quando falamos em uma franquia especializada em prestação de serviços, há um estrito controle de qualidade envolvido, objetivando garantir ao cliente a plena satisfação e o seu retorno em ocasiões futuras. Existem inúmeros procedimentos de controle envolvidos, que variam de segmento para segmento. No caso das franquias focadas no ensino do inglês, o serviço ofertado visa, na maioria esmagadora dos casos, tornar o cliente fluente ou independente no uso do idioma em questão. Há todo um processo envolvido que vai desde a escolha do corpo docente pela franquia, o material didático, a carga horária, o desenho do curso, a duração do mesmo, etc. A entrega do serviço se dá em sala de aula, onde se encontram professores, metodologia, material didático e o cliente, na figura do aluno. Entre as paredes da sala de aula, muito frequentemente, há pouquíssimo controle sobre a qualidade da entrega do serviço. Em outras palavras, o profissional de ensino tem uma autonomia em sala de aula que pode ser prejudicial. Isso se deve ao fato que o cliente, quando busca uma franquia, espera uma padronização dos procedimentos pedagógicos, dos valores e do método, não só dentro da unidade onde faz as aulas, mas na franquia como um todo. Gostaria de salientar que não faço apologia á restrição da criatividade do professor, mas advogo que os valores e o método escolhido pela franqueadora sejam transformados em práticas profissionais, executadas pelo corpo docente.
Como mencionado anteriormente, a gestão é, entre outros, o processo de controlar e garantir a execução das metas com ótimos resultados. Em outras palavras, é o processo de garantir que o cliente (aluno) receberá o que investiu (ensino de qualidade dentro dos padrões pré-acordados). Porém, garantir a execução e a entrega de um serviço que acontece dentro do universo da sala de aula é uma tarefa complexa, mas longe de ser impossível. Falo então, de todo um processo que pode acontecer meses antes do cliente entrar em sala de aula. Listo abaixo alguns dos mais significativos:
Treinamento pré-ínicio das atividades letivas
Um bom professor de inglês, por exemplo, não é simplesmente um falante do idioma ou mesmo um nativo. Quem de nós, apesar de sermos nativos da língua portuguesa, ousamos dar aula de português para estrangeiros? Há pelo menos 60 anos de pesquisa acadêmica que norteia as melhores práticas para a aquisição linguística (terminologia técnica para ‘aprender um idioma’). Garantir que o corpo docente tenha, não somente acesso a essas informações, mas também as internalize em práticas pedagógicas, não acontece do dia para a noite. Nem mesmo com apresentações e/ou palestras isso é possível. Falo aqui de um treinamento mais sólido que contenha não só aspectos teóricos, mas também práticos conhecidas como “micro teaching” ou “mini aulas” onde o professor dá aula para alunos verdadeiros ou simulados e as práticas em questão são aferidas em um contexto próximo do real. Esse acompanhamento é feito pelo coordenador da unidade ou pelo gerente acadêmico da franqueadora. Após o “micro teaching” – que são vários – sessões de feedback garantem que as áreas de fortaleza e atuação sejam esclarecidas e planos de ação sejam desenvolvidos para que o profissional de ensino esteja realmente capacitado para superar as expectativas dos clientes antes mesmo que as aulas comecem.
Treinamentos pós-início das atividades letivas
“A well-qualified and motivated teaching force is to be seen as one of the most vital assets for educational quality”. (Jaap Scheerens)
Tão logo o professor esteja lecionando, seu trabalho deverá sempre ser acompanhado pelo seu coordenador pedagógico e, menos frequentemente, pelo gerente acadêmico. Os treinamentos não devem se resumir a meros encontros pedagógicos. Devem ter metas claras, evidências plausíveis de sua razão e prazos para a implementação das práticas discutidas, além de um plano de acompanhamento para catalisar as curvas de aprendizagem.
O desenvolvimento profissional não pode ser visto como algo que passe despercebido ou que não seja motivado pela instituição de ensino. O treinamento deve ser pautado em evidências de áreas de atuação, especialmente as fraquezas que mais se destoam da missão e valores da instituição de ensino. Essa é uma área onde empirismos tendem a reinar. Portanto, antes de qualquer coisa, há a necessidade de ferramentas que, através de fatos e dados concretos, apontem essas áreas de fraqueza.
Há ainda que se buscar um alinhamento entre os planos estratégicos pedagógicos com a capacidade do corpo docente em converter o planejamento em execução. Nesse interim, treinar o corpo docente é fundamental para que projetos educacionais mais complexos e de maior retorno para a instituição sejam bem sucedidos. Isso requer um processo de capacitação do corpo docente. Por mais óbvio que isso pareça ser, há uma tendência forte em negligenciar essa etapa fundamental ou tratá-la sem o devido enfoque. Sem treinamento adequado, o projeto de mudança ou aperfeiçoamento da entrega dos serviços educacionais não será bem sucedido, com pouca ou nenhuma chance de criar os “deliverables” almejados. Temos aí a tempestade perfeita do universo de gerência de projetos e as suas consequências já conhecidas descritas por Atkins nos anos 80 “Aceitação imediata, entusiasmo selvagem, desilusão, confusão total, caça aos culpados, punição de inocentes, promoção de não-participantes”. Em minha experiência profissional na área da educação, frequentemente percebi que o maior gargalo ou empecilho para que os projetos educacionais criem os deliverables almejados está exatamente em treinamentos para o corpo docente capazes de equipá-los com o conhecimento e técnicas necessárias para que o cliente final receba o serviço educacional de acordo com o planejado.
Utilização de ferramentas de medição de performance e resultado
“Medir é entender, entender é ganhar conhecimento, ter conhecimento é ter força, desde o começo dos tempos. O que torna o homem diferente dos outros animais é a nossa habilidade de observar, medir, analisar e usar essa informação para causar mudanças.” (James Harrington)
É de fundamental importância a utilização de ferramentas que fomentam o desenvolvimento profissional e identificam áreas de fortaleza e fraqueza. Portanto, a avaliação do desenvolvimento profissional com o intuito de gerar desenvolvimento profissional é de suma importância. A presença de um sistema de medição eficiente provoca mudanças no comportamento dos colaboradores, evidenciando prioridades e destacando a busca por resultados em linha com o planejamento estratégico e pedagógico da instituição de ensino.
Com certa frequência o professor deverá ser avaliado de acordo com os requisitos metodológicos da franqueadora. Isso pode ser feito através da delimitação do método em dados quantificáveis e verificáveis em sala de aula.
Através de múltiplas observações, pode-se identificar o perfil do profissional e o desenho de seu desempenho, com as devidas áreas de fortalezas e aquelas que merecem atuação. Os aperfeiçoamentos desejados são catalisados, senão causados, por planos de ação que devem ser desenvolvidos visando sempre a maior qualificação e eficiência do corpo docente, visando sempre gerar maior valor agregado ao serviço oferecido ao cliente.
Além disso, conhecer as demandas dos alunos e seus anseios permite ao gestor identificar tendências e as “necessidades genuínas dos clientes”. A utilização de uma pesquisa de satisfação sucinta e assertiva permite a canalização de críticas e satisfações às pessoas que tem o poder de executar as mudanças cabíveis ou manter os processos que mantem a relação instituição/clientes-finais saudável.
A pesquisa deve ser conduzida pelo menos duas vezes no semestre. Recomenda-se que seja assertiva, cobrindo os pontos que levaram o cliente a escolher o serviço e os valores da franqueadora. Dessa forma, pode-se perceber se o serviço oferecido vai ao encontro das expectativas do cliente, permitindo a manutenção das práticas ou o investimento em planos de correção, antes que o cliente seja perdido.
No contexto educacional que descrevo, falo de inúmeros processos que geram dados valiosos. Entre eles destaco os relatórios de treinamento, de observação de aula, do desenvolvimento profissional dos professores e da pesquisa de satisfação dos alunos, dos números de alunos em situação de potencial evasão, índices de retenção, entre outros. Todos esses são indicadores chave de processo e resultado (respectivamente em inglês KPIs e KPRs). Quando os mesmos estão em linha com o planejado, as chances de resultados previstos são extremamente altas.
Essas ferramentas de gestão e análise geram dados que, quando cruzados, mostram imperfeiçoes que geralmente estão no ponto cego daqueles capazes de tomar decisões, especialmente quando não há ninguém capaz para colocá-los em um mesmo plano, em uma mesma plataforma. Quando isso acontece – o desconhecimento da situação da instituição em relação aos serviços oferecidos e das expectativas dos clientes – há uma potencial situação de caos institucional. O cliente, nesse contexto de abandono gerencial, se torna mais um cliente/aluno confuso e insatisfeito, que desiste do curso frustrando o plano de uma relação saudável, lucrativa (para ambas as partes) e duradoura com a instituição. Além disso, quando a qualidade é a mais prejudicada, o cliente que antes era um promotor, se torna um detrator, arruinando a possibilidade de se ter como novos clientes aqueles que pertencem ao círculo social e profissional do detrator.
Essa miríade de dados não pode ser perdida ou simplesmente disputar espaço na mesa do gestor de forma desorganizada. A utilização de ferramentas oriundas de business intelligencecomo dashboards (que simplesmente reúne diferentes dados em gráficos em uma única tela) tem papel crucial. De forma sucinta, business intelligence é a criação, cruzamento e análise de dados que garantirão o entendimento da situação onde a empresa se encontra permitindo a tomada de decisão de forma assertiva. De acordo com Kaplan e Norton:
“Nenhum piloto se arriscaria a comandar uma nave complexa, como um avião a jato, por espaços congestionados com auxílio de um único instrumento. Pilotos experientes processam informações provenientes de um sem número de indicadores com naturalidade”.
Em suma, ao se atrelar aspectos de gestão estratégica, business intelligence, data mining e uma gestão assertiva do universo educacional, estaremos garantindo uma gestão mais eficiente do negócio, eliminando barreiras e aumentando a qualidade, assegurando aos nossos clientes finais (alunos) um serviço com melhor relação valor/preço, entregando-lhes serviços educacionais que estejam além de suas expectativas. Isso não será alcançado com empirismo, mas através da coleta de dados, de ações provenientes da análise das preferências, tendências e dados oriundos tanto de nossos clientes quanto colaboradores, a fim de traçar metas e processos para se atingir a excelência nos serviços educacionais.
Excelente artigo! A qualidade do dado é muito importante, bem como a ação tomada após o conhecimento do mesmo.
A busca da excelência em uma escola de idiomas tem que ser diária e ser o objetivo de todos os colaboradores.
“Em minha experiência profissional na área da educação, frequentemente percebi que o maior gargalo ou empecilho para que os projetos educacionais criem os deliverables almejados está exatamente em treinamentos para o corpo docente capazes de equipá-los com o conhecimento e técnicas necessárias para que o cliente final receba o serviço educacional de acordo com o planejado.”
Essa sua fala me lembrou aquela história de que na década de 60 um pesquisador foi até a NASA e entrevistou seus funcionários. E ao perguntar a uma faxineira; “O que você faz aqui na NASA?”, ela respondeu: ” Eu estou ajudando a levar o homem a lua!”
Acredito muito na gestão dos processos, mas temos que comover a pessoas para que realmente seja feito a diferença.
“O que você faz aqui na escola de idiomas?” “Eu ajudo as pessoas a realizarem o seu sonho de falar inglês!”
Muito obrigado pelo comentário Fernando. Algo que vejo como negativo no setor educacional é um hiato entre a parte pedagógica e a de gestão. A grande maioria das intituições de ensino ou são norteadas por gestão (e pouco por pedagógico) ou o contrário. A união de gestão + pedagógico é uma constante na minha visa profissional e, sem sobra de dúvida, a gestão de portfolios e projetos são parte da solução. Outra parte passa pela liderança, por uma (verdadeira) gestão de talentos e um RH eficiente. Assunto empolgante que com certeza irá me inspirar para um post futuro 🙂